PT pode não sobreviver à crise se Dilma não vencer os desafios da economia

Os desgastes que o Partido dos Trabalhadores – PT vem sofrendo com denúncias de corrupção, com a crise econômica e com as dificuldades da presidente Dilma em lidar com as principais lideranças política no Congresso Nacional estão mobilizando os principais dirigentes petistas, liderados pelo ex-presidente Lula, numa tentativa de reverter o quadro atual de insatisfação popular alimentada pela ameaça de perda de empregos e de direitos trabalhistas, que imaginavam intocáveis. O clima de desânimo é contagiante e levou alguns tradicionais petistas a manifestarem o desejo de deixar a sigla, antes que coloque em risco o futuro de suas carreiras políticas. A senadora Marta Suplicy já anunciou que vai para o PSB e advertiu: “ou o PT muda ou acaba”. Nos bastidores comenta-se que deverão sair também os senadores Walter Pinheiro (BA), Paulo Paim (RS) e até Delcídio Amaral (MS).

Dirigentes petistas lembram que o futuro do PT está nas mãos da presidente Dilma e do êxito do seu programa de recuperação econômica. O futuro ministro da Educação, Renato Janine Ribeiro, em artigo publicado na imprensa paulista, antes de ser convidado para assumir o Ministro da Educação, crê que “Dilma avessa aos políticos, talvez por não gostar de sua busca desenfreada pela própria vantagem, reticente em relação aos empresários, talvez por descrer que tenham uma visão do Brasil, ela parece que teve de ceder ao mundo real – que não é o melhor dos possíveis, mas é o único disponível”.

COMEÇO DO FIM

Janine, que é professor titular de ética e filosofia na Universidade de São Paulo – USP, escreveu o artigo em janeiro deste ano, fez uma breve análise do governo Dilma e concluiu que “não vai ser fácil conciliar ministros assim diferentes, nem lhe será fácil reduzir seu protagonismo em várias áreas do governo, sobretudo a econômica. Mas esse novo ministério, que não é do sonho de ninguém e duvido que seja dos sonhos de Dilma, sinaliza a possibilidade de desbloqueio de algumas travas políticas, econômicas e sociais a que chegamos”.

A situação do PT ultrapassou as fronteiras nacionais e foi tema de um artigo publicado no jornal francês Le Monde, intitulado “Le Brésil face au chaos politique”, que está reproduzido neste espaço. Lideranças históricas do petismo, como Frei Betto e o teólogo, filósofo e ex-frade franciscano Leonardo Boff mostraram grande preocupação com o futuro do PT. Boff chegou a declarar que “o PT se apresenta como uma resposta ao Brasil que queremos. É um equívoco. O Brasil que queremos é muito mais do que o PT pode apresentar”. Frei Betto não ficou atrás e, em entrevista recente ao jornal O Estado de S. Paulo, foi mais além: “Assistimos ao começo do fim. O PT tende a virar um arremedo do PMDB”.

O jornalista Ricardo Kotscho, amigo de Lula de primeira hora, ex-secretário de Comunicação Social do primeiro mandato do ex-presidente Lula, mostra-se bastante preocupado. Em seu blog “Balaio” escreveu: “Com o mau humor generalizado da população, a falência do sistema político-partidário e a ausência de lideranças respeitadas na sociedade civil, tudo pode acontecer _ e neste cenário de barata voa não costuma ser coisa boa”.

Ao analisar a situação do PT após a manifestação de 15 de março e a reação do publico durante o pronunciamento da presidente Dilma, Kotscho adverte que “o próprio governo federal parece não ter a menor ideia do tamanho que esses atos poderão ganhar, mas agora até a presidente Dilma Rousseff mostra estar bastante preocupada. Depois do panelaço de domingo (8 de março) e dos palavrões e das vaias que ela ouviu ao chegar a um evento em São Paulo, a ficha finalmente caiu”.

DENÚNCIAS DE CORRUPÇÃO

A imagem do PT junto à opinião pública começou a ruir a partir do envolvimento de seus principais dirigentes em casos de corrupção. Primeiro foi o “Mensalão”, que levou alguns dirigentes do partido à prisão e, agora, as denúncias se repetem com a “Operação Lava-Jato”. O Partido dos Trabalhadores está sendo arrastado para o centro das denúncias, envolvendo principalmente seu tesoureiro, João Vaccari Neto, que está sendo investigado pela Polícia Federal. Nos casos de corrupção a ordem é insistir na argumentação de que se ocorreram doações ao partido por parte das empresas envolvidas elas foram absolutamente legais.

Se não bastassem as denúncias de corrupção, a presidente Dilma se viu envolvida numa grave crise econômica, que lhe obriga adotar medidas antipopulares numa desesperada tentativa de reequacionar o combalido orçamento da União. A insatisfação popular é crescente na medida em que aumentam o desemprego e a inflação.

O historiar Marco Antonio Villa não esconde seu desagrado com os rumos do PT e não teme dizer que “a década petista é a década da falácia”. Autor de um livro sobre os dez anos do PT no poder, Villa faz um breve resumo desses dez anos e destaca que “o volume de casos de corrupção tenha sido o maior da história republicana do Brasil. Nunca antes na história deste país houve tanta corrupção quanto na década petista. Gostaria que não fosse assim, mas a sucessão de problemas nos ministérios, de desvios de recursos, nos dois governos Lula e no governo Dilma, é um recorde”.

“A década petista é a década do discurso, a década da falácia. Não há realização material. Que grande obra pública foi construída nesses dez anos? Que usina hidrelétrica foi construída nesses dez anos? Nenhuma. A transposição do São Francisco, um fracasso. Estradas, fracasso. Ferrovias, fracasso. Portos, fracasso. Aeroportos, fracasso. Há apenas a tentativa de construir alguns estádios de futebol, mas não resolveremos problemas sociais com coliseus do século XXI. O PT é bom no palanque, mas um péssimo gestor da economia” concluiu.

Villa não tem palavras elogiosas nem mesmo para o programa “Bolsa Família”. Em recente entrevista à revista “Época”, o historiador e escritor paulista, não nega a importância dos programas assistenciais, mas adverte que não devem existir apenas para “a população não morrer de fome”. “É preciso criar meios para enfrentar a miséria e a pobreza. Não meios que as petrifiquem, como os programas do PT. O governo gasta 0,5% do PIB com o “Bolsa Família”, mas não consegue transformar a vida das pessoas. Enquanto isso, metade do país não tem saneamento básico, a situação da infraestrutura é lamentável, e o analfabetismo funcional e real não para de subir”, explicou.

Leonardo Boff, que foi um entusiasta da formação do PT, fundado em fevereiro de 1980, via no PT uma arma para estabelecer no Brasil um regime democrático, mas nem tudo foi como imaginava e depois de uma década de PT no poder – oito anos com Luiz Inácio Lula da Silva e dois com Dilma Rousseff na Presidência da República – vieram as decepções.

“A cúpula que está no poder fez uma opção, que considero equivocada, e eles estão pagando o preço disso. Em vez de buscar apoio da sociedade, das comunidades, se apoiaram nos parlamentares com as alianças. Sabemos que, no Brasil, as alianças nunca são feitas em nome de um projeto, mas em nome de negociatas, de trocas, de vantagens. Esse PT se corrompeu. Nossa democracia é quase farsesca” – desabafou.

IMPEACHMENT

Frei Betto, que foi um dos fundadores do PT, como assessor do Lula, de quem é amigo há 30 anos, também não esconde sua decepção com os rumos do petismo. Destaca, por exemplo, que “em doze anos, não tivemos nenhuma reforma de estrutura, nenhuma daquelas prometidas nos documentos originais do PT. Nem a agrária, nem a tributária, nem a política. E aí poderíamos acrescentar nem a da educação, nem a urbana. Em suma, o que falta ao governo – e desde 2003 – é planejamento estratégico”. Frei Betto, em entrevista a jornalista Sônia Racy, da Folha, disse que o PT não conseguiu tirar do papel nenhuma reforma de estrutura prometida em seus documentos originais e, ao chegar ao governo, “trocou um projeto de Brasil por projeto de poder, escanteou os movimentos sociais”.

O cientista político Wanderley Guilherme dos Santos, autor do livro “Quem Vai Dar o Golpe no Brasil” – que prenunciou o golpe de Estado e a possível derrubada do presidente Goulart em 1964, garante que a presidente não tem mais liderança. “Houve uma ruptura muito grande entre a base social da esquerda e sua liderança. Ruptura essa que tenho dúvidas de que consiga recuperar”. Ele não acredita que o impeachment seja possível nas circunstâncias atuais, mas se algo de extraordinário acontecer o movimento pode ganhar força, mas coloca nas mãos do PMDB qualquer iniciativa nesse sentido.

– Sem o PMDB não se derruba ninguém. O partido é a fiança do não impeachment. – concluiu.

MARTA QUER CARGOS

A senadora Marta Suplicy não esconde seu desagrado com o PT e já anunciou que tem planos de se transferir para o PSB. Para ela “O PT é um partido que sinto que não tenho mais nada a ver com suas estruturas. É um partido cada vez mais isolado, que luta pela manutenção no poder. E, se for analisar friamente, é um partido no qual estou há muito tempo alijada e cerceada, impossibilitada de disputar e exercer cargos para os quais estou habilitada”

– Cada vez que abro um jornal, fico mais estarrecida com os desmandos do que no dia anterior. É esse o partido que ajudei a criar e fundar? Hoje, é um partido que sinto que não tenho mais nada a ver com suas estruturas. É um partido cada vez mais isolado, que luta pela manutenção no poder. E, se for analisar friamente, é um partido no qual estou há muito tempo alijada e cerceada, impossibilitada de disputar e exercer cargos para os quais estou habilitada.- disse a senadora petista – lamentou.

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