Declaração de inidoneidade e a extensão de seus efeitos, Por Jacoby Fernandes
Contratar com a Administração Pública é qualquer ajuste entre órgãos ou entidades da Administração e particulares, em que haja um acordo de vontades para a formação de vínculo e a estipulação de obrigações recíprocas, com direitos e deveres. Com isso, a aplicações de sanções também é uma previsão da Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993, conhecida como Lei de Licitações e Contratos.
A aplicação de sanções administrativas aos licitantes e contratados da Administração tem previsão no art. 58, inc. IV, da Lei nº 8.666/1993, e visa preservar o interesse público quando este é impedido pela inexecução contratual. A sanção tem caráter repressivo e pedagógico, tem amparo legal e também contratual, evidenciando a decisão da Administração Pública em aplicá-la.
As sanções dispostas na Lei de Licitações são advertência, multa, suspensão temporária de participação em licitação; impedimento de contratar com a Administração por prazo não superior a dois anos; e declaração de inidoneidade para licitar. Sobre o assunto, surge a dúvida, no tocante à penalidade de declaração de inidoneidade para licitar ou contratar com a Administração Pública, é possível que essa declaração atinja os demais ajustes celebrados pela empresa sancionada, ocasionando uma espécie de rescisão coletiva?
Efeitos da inidoneidade
O advogado e professor de Direito Jorge Ulisses Jacoby Fernandes explica que existem discussões sobre os efeitos da penalidade de declaração de inidoneidade.
“Para alguns, o efeito se restringe ao órgão e ao contrato em que se aplica. Para outros, se estende a todos os órgãos, restringindo o direito de participar de licitações e firmar novos contratos. Há, ainda, os que pretendam restringir o direito à continuidade dos contratos já firmados, acarretando inclusive o chamado efeito dominó, isto é, fazendo rescindir outros contratos”, observa.
O Tribunal de Contas da União – TCU entende que os efeitos da declaração de inidoneidade afetam todos os órgãos da Administração Pública. A Corte de Contas filia-se, portanto, à literalidade da Lei Geral de Licitações e Contratos e à tese de que a declaração de inidoneidade aplicada a um ente da federação é suficiente para restringir direito de licitar ou contratar.
“O fundamento desse entendimento está no fato de que o legislador, no art. 87, inc. III, usou a expressão Administração e, no art. 87, inc. IV, a expressão Administração Pública. Como essas expressões foram conceituadas pela própria Lei de Licitações e Contratos no art. 6°, inc. XII e XI, respectivamente, é razoável que se considerem esses efeitos. É preciso, porém, destacar que o efeito da declaração de inidoneidade não pode atingir os contratos em andamento. Caso a empresa proceda mal em relação aos outros contratos, estes poderão ter estendidos os efeitos, na forma do art. 88 da Lei de Licitações e Contratos”, ressalta Jacoby.
Dessa forma, para o professor, se há lei expressa dispondo sobre o procedimento para extensão da penalidade aos contratos em andamento, é indispensável afastar qualquer outra interpretação que vise à extensão automática dos efeitos para todos das declarações de inidoneidade, de uma para outra unidade da federação.
“A extensão automática não é adequada, pois o Estado brasileiro deu aos entes federativos, na forma do art. 18 da Constituição Federal, a capacidade de autoadministração. Em nome desta capacidade, é inviável a recepção automática de uma penalidade imposta por um agente político de outra esfera sem abandonar ou mitigar com severidade a autonomia do ente receptor”, destaca.
Nesse sentido, a declaração de inidoneidade pode afetar todos os entes da federação, restringindo o direito subjetivo da empresa de participar de licitação e de ser contratada. Não afeta, contudo, por extensão automática, os contratos em vigor.
“Somente nas hipóteses restritas previstas em lei é que se admite o rompimento do contrato. Em simples leitura do art. 78 da Lei nº 8.666/1993 não se encontra nenhum dispositivo aderindo a possibilidade de rescisão em decorrência de declaração de inidoneidade aplicada por terceiro. Isso se explica porque o legislador assegura a cada contrato a fiel observância de suas próprias cláusulas, admitindo somente em condições excepcionalíssimas a interferência de fatos alheios ao ajuste”, afirma Jacoby.