90% defendem, mas redução de maioridade penal não acena para solução de crimes. Por Pierre Pichoff
Apesar de mais de 90% dos brasileiros defenderem a redução da maioridade penal de acordo com uma pesquisa da CNT de 2013, outras vozes se levantam, no momento em que a matéria entra em discussão na pauta do Legislativo e perguntam: essa reforma ajudará a sociedade brasileira a lutar contra os crimes?
A criminalidade é a consequência de crianças e adolescentes vindo da pobreza, de famílias desestruturadas, sem educação adequada. Reduzindo a menoridade irá somente atacar a consequência e não as causas», disse Leticia Torrano, defensora publica da união que atua na área criminal no Rio de Janeiro.
Esse ponto é fundamental para o debate. Os crimes cometidos por uma criança é sempre consequência de uma educação desestruturada e de uma criação com falta de valores. A pobreza é uma agravante que pode ser o fato determinante para um menor optar pelo caminho fácil do crime para obter o que o Estado não foi capaz de lhe assegurar: o acesso ao mínimo de bem estar social.
O mais preocupante é o fato de que os legisladores parecem ter convicção de que, com a redução da maioridade penal de 18 anos para 16 anos, os jovens brasileiros temerão de ficar atrás das grades. Sem esses jovens «no mercado» do crime, é ingênuo pensar que os bandidos adultos não encontrarão outros jovens ainda mais jovens para matar, roubar e traficar no lugar deles.
Como em qualquer mercado, será sempre a lei da procura e da oferta que reinará. Por isso, é certo que adultos criminosos buscarão crianças de idade menor. Não faltam reportagens de crianças de oito, dez anos portando armas, treinadas para o crime.
Penas mais rigorosas para jovens entre 16 e 18 anos não parece ser argumento suficiente para a defesa da redução da maioridade penal ao levar em conta o índice revelado pela Unicef de que apenas 1% dos crimes cometidos ocorrem nesta faixa etária.
Será que um jovem de 16 anos pensa radicalmente diferente de um outro jovem apenas dois anos mais velho? Um individuo que vive em permanência no meio da violência, sem perspectivas de um futuro promissor e sem dinheiro para sobrevivência própria e de sua família não teme nenhuma corte de Justiça. Pode ser que uma pena mais dura faça o jovem de 16 anos avaliar se o crime compensa, mas essa apreensão não vai compensar a condição de vida em que se encontra.
As consequências de pôr um jovem com outros adultos na cadeia é um esquecimento grave do legislador a favor da nova lei
Para ilustrar esse ponto, é interessante olhar o caso da França. É na cadeia, em que estão encarcerados adultos e adolescentes juntos, onde jovens foram cooptados por extremistas religiosos do El. Foi assim o início de atentados terroristas que abalaram o mundo, como o que ocorreu no Charlie Hebdo.
Os terroristas que mataram as 17 pessoas na sede da revista são extremistas que se formaram nas prisões com radicalistas religiosos. Esses últimos têm como único objetivo recrutar criminosos para realizar outros crimes e assim continuar «essa guerra» sem vencedores.
Recrutar um adulto ou um jovem não faz a minima diferença para criminosos brasileiros, franceses ou de outra nacionalidade. Será uma outra munição para um próximo ato de barbaria fora das grades.
O que seria a solução ideal?
O fato de não existir solução ideal não deve ser motivo para que uma sociedade desista de educar os seus jovens.
O crime é sempre o resultado da ausência de educação e criação, por isso, os primeiros responsáveis, sem ofensas, são os pais e o Estado.
Insultos, violências, alcoolismo, droga, famílias não planejadas são alguns dos fatores que levam adolescentes a procurar no crime uma saída para uma vida com mais recursos.
Por outro lado, o Estado, que assegurou direitos sociais em sua Constituição, deveria assumir sua própria culpa em assistir jovens, praticamente crianças, praticando crimes na sociedade.
Ao menos uma das etapas desse esquema vicioso tem que ser destruída: A falta de estrutura da escola, seja por desvio de dinheiro ou incompetência, que deixou o jovem ser capturado nas ruas para o crime. E tirará desse jovem a chance de ascensão social pelo estudo. Por outro lado, justiça seja feita, o Brasil é um dos poucos países do mundo onde é possível trocar de classe social pelo estudo. Não faltam exemplos.
E é esse o desafio do governo fazer o adolescente que se encontra na encruzilhada entre o caminho fácil do crime para um retorno financeiro rápido e efêmero escolher pelo caminho mais duro e reponsável da educação, que o tornará um adulto de sucesso.
Para o ministro do Supremo Tribunal Federal, Marco Aurélio Mello, a redução da maioridade penal, debatida atualmente no Congresso Nacional, não deve diminuir a violência no país: “Não vamos dar uma esperança vã à sociedade, como se pudéssemos ter melhores dias alterando a responsabilidade penal, uma faixa etária para se ser responsável nesse campo. Cadeia não conserta ninguém”, disse.
A presidente da República, Dilma Rousseff, também manifestou-se contrária à redução da maioridade penal por meio de sua conta no Facebook: “Não é solução. Os adolescentes não são responsáveis por grande parte da violência praticada no País. Os atos infracionais cometidos por eles não chegam a 10% do total dos crimes praticados no Brasil há décadas”, postou.
Já o presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha, afirmou que é a favor da diminuição da maioridade penal. Cunha argumentou que a mesma responsabilidade que é dada ao jovem para eleger o maior representante da Nação (presidente da República) deve existir também ao responder por seus atos criminosos.
“Eu tenho minha opinião pessoal: quem pode eleger o presidente da República pode ser responsabilizado por seus atos. A comissão especial que analisará a PEC já foi instalada e começará a funcionar ainda em abril” declarou.