Licença para interesse particular pode ser revista pelo Poder Judiciário
A licença de direito do servidor público federal quando pretende tratar de interesses particulares pode estar por um fio. Isso porque, em decisão recente, o Superior Tribunal de Justiça – STJ abriu precedente ao conceder ao magistrado a faculdade de análise dos motivos e da finalidade do ato, sempre que verificado abuso por parte do administrador.
Embora, em regra, não seja cabível ao Poder Judiciário examinar o mérito do ato administrativo discricionário – classificação na qual se enquadra o ato que aprecia pedido de licença de servidor para tratar de interesse particular – o STJ decidiu intervir em um caso no caso em que um servidor teve o pedido negado.
O STJ entende que, diante de manifesta ilegalidade, não se pode falar em invasão do Poder Judiciário na esfera Administrativa, pois é de sua alçada o controle de qualquer ato abusivo. A corte entende que não se pode admitir a permanência de comportamentos administrativos ilegais sob pretexto de estarem acobertados pela discricionariedade administrativa.
Regulamentação da licença
A licença para interesse particular está regulada no art. 91 da Lei n° 8.112, de 11 de dezembro de 1990. Segundo a norma, a critério da Administração, poderão ser concedidas ao servidor ocupante de cargo efetivo, desde que não esteja em estágio probatório, licenças para o trato de assuntos particulares pelo prazo de até três anos consecutivos, sem remuneração.
O servidor não poderá recusar retornar ao exercício do cargo, caso seja solicitado pela Administração em virtude de necessidade do serviço, pois a licença tem a natureza precária e pode ser interrompida a qualquer tempo, a pedido do servidor ou a interesse do serviço.
Nesses casos, em regra, o Poder Judiciário não poderia ser acionado para discutir o mérito da concessão. Todavia, poderá ocorrer o controle na hipótese de manifesta ilegalidade e de a Administração ter se utilizado de motivação idônea para recursar a licença.
Segundo o advogado e professor de Direito Jorge Ulisses Jacoby Fernandes, é preciso distinguir o ato vinculado da teoria dos motivos determinantes do ato administrativo. “Essa teoria, originada na França, estabelece que o motivo alegado pelo agente para praticar um ato é vinculante; a validade, nesse caso, depende da compatibilidade entre o ato e o motivo alegado. A teoria assume, na prática, relevância em relação aos atos discricionários, porque o motivo é expresso pelo agente público”, explica.
Desse modo, aplicando-se a teoria, pode um ato ser anulado, mesmo que guarde aparente conformidade com a lei, se houver desconformidade entre o motivo alegado e o ato praticado.
De acordo com o professor Jacoby Fernandes, no entanto, não poderá ser concedida licença para tratar de interesses particulares a servidor que tenha ficado ausente para estudo ou missão oficial, antes de decorrido período igual ao do afastamento, ressalvada as hipóteses de ressarcimento da despesa e de servidor que esteja respondendo a Processo Administrativo Disciplinar – PAD ou possua débito com o erário. “Além disso, essa licença não pode ser prorrogada e não é computada para nenhum fim, exceto se houver a devida contribuição previdenciária”, informa.
Durante o período de tempo do afastamento, o servidor deverá devolver ao órgão todos os materiais que estejam sob sua guarda e responsabilidade. O servidor que requerer a licença para tratar de interesses particulares não terá a obrigação de explicar o motivo da licença à Administração; o ato de concessão, no entanto, é discricionário. O servidor que gozou do período de três anos poderá requerer novamente depois de decorridos 60 meses da licença.